Com cálculos às vezes complexos e números disparatados, elas dizem que qualidade é tudo, mas 1 homem só é pouco
Publicado na revista da Folha – Folha de S.Paulo – Ano 14 – nº 667 – Págs. 12-17
1 de maio de 2005
Por Débora Yuri – Jornalista
3 é pouco, 10 é bom e 30 é um absurdo? Para algumas mulheres, sim. Mas, para outras, 10 é ridículo, 20 é provável e 30 está longe de ser o limite. A pergunta feita de supetão pela Revista era simples: com quantos homens uma mulher deve transar ao longo da vida? A segunda questão vinha para contextualizar (ou complicar): por que esse número de parceiros é o ideal?
A reportagem ouviu cem mulheres, de teens a sessentinhas, para tirar uma média. Afinal, o que é mais importante, qualidade ou quantidade? Ou qualidade e quantidade? Mesmo com qualidade, ainda que a mulher tenha encontrado logo o príncipe encantado, não vai sobrar uma curiosidade tardia do tipo “como teria sido se…”?
Invariavelmente, a primeira reação das entrevistadas é dar uma gargalhada. Passado o desconforto inicial, muitas fazem contas, usando os dedos e puxando pela memória. Raríssimas dizem um número logo de cara: no fundo, o assunto é tratado com seriedade pelo sexo feminino. Não à toa, pouca gente se esquece da cena do filme Quatro Casamentos e um Funeral (1994) em que Andie MacDowell enumera e comenta os 33 amantes que teve até então para um desolado Hugh Grant, “míseras” 9 mulheres no currículo.
“Nós já tivemos essa conversa. Para mim, 20 é um bom número, porque é provável que aconteça”, diz a fisioterapeuta Paula Prisco, 23, sentada na calçada de um bar da Vila Madalena com a amiga Susanne Araújo Olivieri, 23, que estuda geologia na USP. “De 25 a 30 é o ideal, porque vai chegar uma hora em que eu vou querer estabilizar, não necessariamente casar. Quando? Acho que com uns 32 anos”, calcula Susanne.
“30 e poucos” parece ser a idade escolhida pelas mais jovens para se “aquietar”, mas, para quem tem “20 e poucos”, esse futuro parece distante, o que influencia decisivamente na contagem final. “Como, a partir dos 30 e tantos, eu quero estar com alguém numa relação séria, 35 parceiros está bom”, diz Nara Essaki, 24, que estuda psicologia no Mackenzie e está namorando há dois anos.
Sua amiga Camila Machado Pedroso, 24, psicóloga, faz eco. “Transando dos 15 aos, espero, 70 anos, eu diria 45 parceiros. Porque todo mundo quer a sua ‘família Doriana’, até as mais desvairadas. Mas antes de encontrar o cara certo queremos aproveitar, ter mais experiências”, explica.
Na aritmética da cama, a maioria das mulheres elege qualidade e competência como quesitos mais importantes e com peso maior. Mas, como sempre, sobra controvérsia. “Nós fazemos a seleção natural; os homens são pura estatística, transam com qualquer bagulhão. Mas há mulher de todos os tipos: temos amigas que acham que, quanto mais, melhor”, diz Susanne.
“O mais importante é a qualidade, mas não vale ter só um parceiro de muita qualidade, porque aí não dá para comparar. Ele é melhor do que o quê?”, ressalta a agente de aeroporto Luciana de Queiroz Maffra Telles, 36, que cita 13 como o número ideal de homens.
“Não adianta ter cem parceiros com o sexo feito de forma precária, rápida, com preconceitos, sem entrega”, afirma a sexóloga e psicanalista carioca Regina Navarro Lins, 56, autora de Cama na Varanda (ed. Rocco). A variedade, entretanto, pode ser bem-vinda, diz ela. “Os homens sempre gostaram disso, as mulheres é que se inibem mais. Ninguém quer comer a mesma comida nem vestir a mesma roupa sempre”, compara. (Lembra quando eram eles que diziam isso e elas achavam um horror?)
Regina diz que não deve existir um limite, “nem para mais nem para menos”. “A mulher tem que ser livre para transar com quantos tiver vontade, e é uma bobagem ficar repetindo que sexo só é bom com amor. A tendência é elas perceberem que sexo e amor são coisas distintas. Elas podem buscar e viver só uma transa intensa, o que já não é pouco.”
Para a psicanalista Eliana Calligaris, autora do livro Prostituição: o Eterno Feminino (ed. Escuta), o que permite uma sexualidade prazerosa não é o número de parceiros que a mulher “coleciona”, mas o acesso às fantasias sexuais que decidem a possibilidade de entrega do corpo. “Uma mulher pode encontrar sexualmente 200 homens, não entregar-se a nenhum e passar a vida reclamando que não teve prazer com eles.”
Giovanna Bartucci, 43, membro efetivo do departamento de psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae, vai na mesma linha: “Se a mulher não se sentir livre em relação à própria sexualidade, transar com 5, 20 ou 100 será a mesma coisa.”
Placar Preferências à parte, o resultado da enquete feita pela reportagem revela que:
1) “Com quantos caras ela quiser” é a resposta feminista-politicamente-correta;
2) “Não existe um número ideal” é o mote de quem quer evitar fazer -ou revelar- as contas;
3) 10 é um número “neutro”, que não assusta por não ser considerado alto ou baixo demais.
Um placar equivocado, em qualquer direção, pode pegar mal na roda de amigos. Não dá para ignorar que o número de parceiros ganha usualmente um peso moral, e mesmo as mulheres que querem “aproveitar a vida” têm medo -quase pavor- do rótulo de “facinhas”.
“Você tem que fazer o que te faz feliz, sem se preocupar se te acham vagabunda. Mas, se eu passar dos 100, vou achar demais”, resume a analista de mercado Daniela Barbosa, 25, para quem 50 é um “número razoável”.
E que números podem manchar a reputação? Depende do eleitorado. “Acho que muitas respondem 3 ou 10 querendo ser bonitinhas ou 200 para parecer moderna. O número ideal é aquele que te satisfaz sem te machucar. Para mim, 75. Mas é legal parar e pensar a respeito, se estamos nos reprimindo ou nos soltando demais. Esse assunto não é para ser um bicho-de-sete-cabeças”, diz a psicóloga Daniela Róo, 27.
Não é para ser, mas acaba sendo, porque o exercício da sexualidade inevitavelmente acarreta conseqüências sociais e psicológicas. “Se a mulher transa muito, fica mal-falada, depois não consegue namorar – e ela também quer namorar. Psicologicamente, muitas se sentem usadas, vazias, a auto-estima cai. E a mulher tem mais medo disso do que de Aids e gravidez”, acredita Ailton Amélio da Silva, 56, professor de relacionamento amoroso do Instituto de Psicologia da USP.
Por outro lado, um score muito baixo também pode incomodar, e o problema é encontrar a justa medida. “É bom ter uma certa experiência. Mas acho que ter 50 homens não é muito diferente de ter 12. Até certo ponto, as diferenças são grandes; depois, não muda muito. É como dirigir: no primeiro ano, treinar mais faz diferença, mas, depois, o modo como você dirige não vai mudar muito com o aumento de prática”, explica o professor.
Iniciantes x veteranas Interessante notar que 77% das entrevistadas apontaram um placar com dois dígitos ou mais, pouco importando a idade. “A mulher tem que ter pelo menos 20 homens – e eu estou jogando baixo. Considerando que acertar o alvo perfeito é difícil e que você vai ter que ficar procurando nas bordas, pelo menos dez experiências diferentes são necessárias”, acha a produtora de vídeo Silvia Suckeveris, 48, casada três vezes, divorciada, um filho de 14 anos, representante de uma época em que “os únicos perigos eram sífilis, gonorréia e gravidez”.
Fala a gerente executiva na área editorial Sandra Rodrigues, 55, solteira: “Eu diria no mínimo 30 parceiros, mas venho de uma geração diferente. Vivi a fase da revolução sexual, estudei filosofia na USP, era comum você ir a uma festa e sair de lá para transar com alguém. A Aids mudou tudo, a gente começou a ver amigos morrendo. O sexo ficou planejado e baixou muito o número de parceiros”.
Sandra acha que não se pode dividir as mulheres pela faixa etária, e sim pelo “tipo”. “Cada geração tem as meninas estudiosas, as caretas, as putas e as modernas, que não são putas”, define. O raciocínio faz sentido quando se compara a posição de entrevistadas de épocas bem distintas.
“Acho arriscado casar virgem. As pessoas falam ‘no meu tempo era diferente’, mas os meus tempos são hoje. Esse é o tempo de todo mundo que está vivo”, diz a professora aposentada Trinidade Espinosa, 66, que se casou pela segunda vez há dois anos e considera 3 um número ideal – quase o mesmo apontado pela adolescente Juliana*, 50 anos a menos, que disparou um convicto “5 e olhe lá”. Tudo bem que ela foi exceção na turma de seis alunas entre 16 e 18 anos que moram em São Miguel Paulista, zona leste. As colegas se espalharam na faixa entre 10 e 30 parceiros.
Na porta de um colégio de classe média-alta em Pinheiros, um grupinho de garotas de 15 anos, alunas do 1º ano, chuta a média para cima: 30, 35, “de 40 a 50” e 70. “Não quero casar, quero juntar, e quero fazer isso com uns 35 anos. Mas 35 caras pode ser pouco, então coloque 70”, diz Sofia*. Numa escola de Moema, os números citados pelas meninas de 16 a 18 anos vão de 7 a 50 – 20 foi o mais votado.
Teve quem falasse 200, mas nenhuma mulher disse 1. “Todas deviam ter a chance de transar com pelo menos 3, porque talvez você não ache o príncipe encantado logo”, diz a representante de vendas Fernanda Roberta Garcia de Oliveira, 33.
A conta Na hora de contar, vale também descontar. “Alguns homens são nulos, fazem a mulher ter que contar para trás. Eu estava no 9 e, pensando bem, decidi voltar para o 8. Na verdade, estou vivendo a maldição do número 10, porque idealizei esse cara, acho que ele não pode ser qualquer um”, diz a jornalista Fabiana*, 27.
Quem falha na hora H, por exemplo, não é somado, vira conjunto vazio. E, afinal, existe fração? “O problema é que você não sabe se inclui alguns na lista. Um até hoje eu não sei se conto, era desse tamanho”, lamenta a advogada Anna Ruth Xavier De Vecchi, 32, fazendo sinal de “pequenininho” com os dedos.
“Acho que 5; não sou careta, mas tenho um defeito: nunca transei com alguém sem saber o nome”, diz sua amiga Maria Emilia Sette e Silva, 30, também advogada. Depois de pedir um tempo para fazer as contas, Maria Emilia descobre que já passou dos 5. “Nossa, então coloque 8, porque a gente ainda tem muita lenha para queimar. É que a minha cabeça é diferente, eu tenho coleção de discos de vinil. E hoje existe o Orkut, os bate-papos na internet.”
A socióloga Tereza*, 27, desenvolveu um cálculo complicado baseado em namoros, rolos e “fases de estiagem”: “Considerando que você comece a transar com 17 anos, tenha 2 parceiros novos por ano e passe alguns anos namorando, e como sempre existem umas figurinhas repetidas, e assumindo que você decida parar de trair os seus namorados, ou seja, case, isso por volta dos 35 anos, acho que a conta final é essa, uns 45 parceiros”.
Para os curiosos e curiosas de plantão, a média de parceiros ideal para uma vida, com base na soma das cem mulheres ouvidas, foi 23.
O que querem as mulheres
23 entrevistadas – Até 9 homens
33 entrevistadas – 10-19
16 entrevistadas – 20-29
12 entrevistadas – 30-39
6 entrevistadas – 40-49
8 entrevistadas – 50 a 99
2 entrevistadas – 100 ou mais
Frases
“Acho arriscado casar virgem. As pessoas falam ‘no meu tempo era diferente’, mas os meus tempos são hoje. Esse é o tempo de todo mundo que está vivo.”
Trinidade Espinosa, 66, professora aposentada, que se casou pela segunda vez há dois anos e considera 3 parceiros o ideal
“Eu penso assim: 7 quando você é jovem, aí vem uma fase mais calma, de autoconhecimento, e depois a época dos companheiros, porque nessa fase você dá mais valor a isso. Acho que a idade ideal para encontrar o cara certo é depois dos 35.”
Luciana de Queiroz Maffra Telles, 36, aposta em 13 parceiros
“Sempre converso com as minhas amigas sobre o número ideal de homens para a mulher poder sossegar e se estabilizar. Três é ridículo, não dá base de comparação. O grande problema é você casar e ter tido 2, e passar o resto da vida se perguntando como são os outros.”
Nara Monteiro, 27, publicitária; sua aposta: 15 parceiros
* Nomes trocados